Audiência pública discute inserção de jovens aprendizes em empresas de Sorocaba

Sorocaba - O Ministério Público do Trabalho (MPT), o Ministério do Trabalho (MT), o Ministério Público do Estado de São Paulo e o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região - por intermédio do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) de Sorocaba -, promoveram nessa segunda-feira (8) uma audiência pública com as 100 maiores empresas de Sorocaba para discutir a profissionalização e a inserção de jovens no mercado de trabalho por meio da aprendizagem. O evento foi realizado no Teatro Municipal Teotônio Vilela, com a presença de aproximadamente 300 pessoas.

O objetivo da audiência foi sensibilizar as empresas para o cumprimento da cota de aprendizes, conforme preveem a Lei 10.097/2000 e os artigos 428 e 429 da CLT, orientando sobre o dever legal e social de oferecer a aprendizagem como forma de prevenir ações judiciais, garantir emprego digno e reduzir a incidência de casos de trabalho ilegal de pessoas menores de 18 anos.

A audiência contou com a participação de integrantes da rede de proteção da criança e do adolescente, de entidades sindicais, de organizações não-governamentais da região, da OAB e da Prefeitura Municipal de Sorocaba.

A abertura do evento contou com a apresentação do coral, banda marcial e das dançarinas da Guarda Mirim de Sorocaba e da Oficina de Integração Céu Azul, entidades formadoras de aprendizes na cidade de Sorocaba. Eles apresentaram o Hino Nacional Brasileiro e dois números musicais à plateia do teatro municipal.  

Após a manifestação de representantes dos trabalhadores e das empresas, o gerente regional do trabalho de Sorocaba, Rodolfo Pimenta Casagrande, iniciou a mesa de abertura conclamando o empresariado para que dê oportunidades de profissionalização a jovens a partir de 14 anos, não apenas como forma de cumprimento legal, mas também de garantir a sua função social. “A aprendizagem é mais que uma obrigação legal. Ela é vista como uma ação de responsabilidade social, como agente de promoção de cidadania. O Ministério do Trabalho não existe apenas para fiscalizar, mas também para orientar as empresas. O nosso objetivo não é a multa, mas a inserção dos jovens no mercado de trabalho”, afirmou. Segundo o Ministério do Trabalho, há mais de mil vagas não preenchidas entre as maiores empresas da cidade. O índice de cumprimento da lei não chega a 20%. 

O prefeito municipal de Sorocaba, José Caldini Crespo, ressaltou a importância da realização do evento na cidade, haja vista os problemas de segurança pública envolvendo adolescentes aliciados pelo crime organizado, e como o envolvimento dos empresários pode mudar essa realidade. “O direito não é uma ciência exata, as interpretações são várias. Aquele que procura uma segurança jurídica tem dúvidas, portanto, estar num evento como esse, em que o foco principal é o encaminhamento do jovem rumo à aprendizagem, é muito importante. Isso abrirá oportunidades das mais necessárias, não só para o futuro profissional dos jovens, mas para que eles escapem do assédio do crime organizado que está presente em nossa cidade”, disse.

Para o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Campinas, Eduardo Luís Amgarten, a participação do empresariado no preenchimento da cota legal de aprendizagem evitaria a “perda de mais uma geração”, citando o tempo decorrido desde a criação e regulamentação da Lei da Aprendizagem até os dias atuais. Segundo ele, o cumprimento da legislação vem sendo ignorado há muitos anos pelas empresas. “Pertencemos a uma nação valorosa. Estamos todos reunidos aqui para mudar o país. A oportunidade que temos é essa audiência pública, para a produção de um saber que possa trazer mudanças, de forma que possamos fazer a diferença na comunidade onde estamos inseridos. Depende de nós”.

Finalizando a mesa de abertura, o presidente do TRT-15, Fernando da Silva Borges, ressaltou o trabalho interinstitucional empreendido pelos órgãos públicos no combate ao trabalho infantil e em prol da inserção de jovens nas empresas por meio da aprendizagem, e como isso pode repercutir positivamente no atendimento das demandas sociais. “Essa audiência decorre do alinhamento das instituições. Eu sempre disse que as coisas só podem acontecer no país quando as instituições se unem, porque cada uma tem a sua faixa de competência e atuação. Onde uma atua e não há uma sequência daquela que daria a continuidade, simplesmente se perde o trabalho e nada acontece. Por isso que o judiciário tem todo o interesse numa questão social como essa”, citou.

Bom para todos - A primeira palestrante do dia foi a procuradora do MPT no Rio de Janeiro Dulce Martini Torzecki, que falou sobre os critérios a serem atendidos pelas empresas no tocante à contratação de jovens aprendizes, as obrigações vigentes na lei e as propostas do Ministério Público para a efetivação dos critérios legais.

Dulce afirmou que, segundo as constatações do MPT, a cota não vem sendo cumprida no país, lamentando a resistência do empresariado no cumprimento da lei, mesmo após tantos anos após a sua criação. A procuradora ressaltou os benefícios da contratação de jovens aprendizes para as empresas. “Nas minhas andanças e trabalhos realizados pelo país ouvi de muitos empresários os aspectos vantajosos da aprendizagem. Aquele aprendiz contratado tem potencial para se tornar um futuro empregado qualificado, que veste a camisa da empresa, especialmente porque eles se sentem valorizados. O aproveitamento dessa mão de obra gera um encurtamento na contratação de profissionais, evitando entrevistas e seleções de trabalho. É um investimento que trará um retorno quase imediato. Sem contar que os jovens contratados, que receberão uma contrapartida salarial, poderão contribuir com sua renda no consumo dentro do próprio município”, explicou.  

Aprendizagem e inclusão social - A palestrante também chamou atenção para a necessidade de um olhar mais social das empresas no momento de selecionar os jovens com potencial para ingressar na aprendizagem. “Eu trago a vocês (empresários) duas propostas: buscar jovens em vulnerabilidade social junto aos órgãos municipais, e fazer um trabalho preventivo, retomando o adolescente da situação de trabalho infantil e criminalidade”, disse.

A procuradora disse que não há motivos para que as empresas deixem de contratar aprendizes, mesmo que haja a alegação com base em questões físicas (trabalho insalubre e perigoso ou falta de estrutura). Após uma modificação na CLT, em 2014, e pela publicação de um decreto, em 2016, as empresas podem oferecer vagas aos usuários do sistema nacional de atendimento socioeducativo. “O jovem que está cumprindo medida socioeducativa tem o direito à formação profissional, previsto na Constituição Federal. É uma obrigação nossa, de Estado e sociedade, oferecer a ele essa alternativa. É evidente o potencial desses jovens e o desespero deles na busca por oportunidades. A sua ressocialização também está nas nossas mãos”, finalizou.

Reversão social - A vice-presidente do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, Silvia Moral, fez uma breve exposição sobre como o recolhimento do imposto de renda pode ser revertido para o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA), de forma a financiar políticas públicas municipais voltadas para a proteção social de crianças e adolescentes.

Realidade pode ser mudada - Finalizando a audiência, a promotora de justiça Ana Alice Mascarenhas Marques reforçou a necessidade da participação de todos os atores sociais nos trabalhos por mudanças em prol da boa formação dos jovens, de forma a “atingir a meta do jovem aprendiz”. “Todos os anos atendemos dois mil adolescentes envolvidos com organizações criminosas na Promotoria de Sorocaba. Precisamos mostrar que podemos nos organizar junto com a sociedade e, especialmente, com os empresários e com os conselhos municipais de políticas públicas, para trazer um pouco de ordem e progresso para o nosso país, tão desejados por todos”, afirmou.

Para mostrar que é possível desenvolver a juventude com trabalho conjunto, a promotora expôs os resultados do programa Escola Integradora, que busca a solução de problemas graves (como atos infracionais e aqueles que acometem famílias em situação de risco social) a partir da atuação em escolas estaduais e nas comunidades do entorno. “O problema só é destacado quando chega no sistema de justiça, e isso deve ser mudado. Nós buscamos, com esse programa, trabalhar as políticas públicas já existentes no município para diminuir os índices de vulnerabilidade social, evasão escolar, aprendizado abaixo do esperado, o uso de drogas dentro e no entorno dos estabelecimentos de ensino, além dos conflitos no ambiente escolar”, ressaltou.

Depoimentos – Quatro pessoas foram à frente, no palco do teatro municipal, para falar sobre suas experiências como aprendizes em grandes empresas da região de Sorocaba. Os depoimentos demonstraram a eficácia da aprendizagem na vida profissional dos jovens e também a oportunidade que as empresas têm na formação de mão de obra qualificada. 

Notificação – A segunda mesa do evento foi conduzida pelo procurador Juliano Alexandre Ferreira, do MPT em Sorocaba, e pelo desembargador e presidente do Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e do Estímulo à Aprendizagem do TRT-15, João Batista Martins César. No encerramento da audiência, Ferreira alertou os presentes acerca do cumprimento da Lei de Aprendizagem e dos artigos 428 e 429 da CLT dentro do prazo concedido pelo Ministério Público a partir dessa segunda-feira. “Todas as empresas presentes na audiência pública receberam notificações recomendando o cumprimento da cota legal para contratação de aprendizes no prazo máximo de 120 dias”, afirmou.   

Sobre a aprendizagem - A Lei da Aprendizagem determina que as empresas de médio e grande porte contratem um número de aprendizes equivalente a um mínimo de 5% e um máximo de 15% dos trabalhadores existentes, cujas funções demandem formação profissional. Apesar da obrigatoriedade para empresas maiores, toda organização pode ter aprendizes, desde que o faça com rigorosa observação à lei. De acordo com a legislação, a contratação tem um prazo determinado de, no máximo, dois anos. Para participar, os adolescentes e jovens entre 14 e 24 anos incompletos precisam ter concluído ou estar cursando o ensino fundamental ou médio.

 

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