Destinação do MPT possibilita descobertas científicas inovadoras no tratamento do câncer infantil

Estudos empreendidos pelo Hospital de Amor, a partir de verbas do caso Shell-Basf, possibilitam diagnósticos mais rápidos e precisos, além de novas formas de tratamento

Campinas – Dois estudos realizados pelo Centro de Pesquisa Molecular em Prevenção do Câncer do Hospital de Amor, de Barretos (SP), construído a partir de recursos destinados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no caso Shell-Basf, estão proporcionando avanços significativos no tratamento de pacientes oncológicos. A verba destinada pelo MPT também contribuiu para as pesquisas, por meio do custeio de exames de sequenciamento genético.

O primeiro é um estudo que identificou a eficácia de testes moleculares para subclassificar um tumor cerebral chamado meduloblastoma, que ocorre com maior frequência em crianças, mas também pode acometer adultos. Segundo os pesquisadores, liderados pelo médico Rui Reis, essa classificação é importante para direcionar tratamentos mais adequados, de acordo com os resultados obtidos.

“Dependendo da classificação genética, a criança vai ter uma evolução diferente, e saberemos, por exemplo, se ela precisará de rádio e quimioterapia. Validamos um método que permite fazer essa classificação molecular, e hoje ele se aplica no dia a dia. Toda criança com esse tipo de tumor faz esse exame e ele vai para o prontuário do paciente. Estamos falando de realidade clínica, de uma pesquisa que se traduz em uma mudança na rotina clínica”, afirma Reis.

O método utilizado para a classificação do tumor cerebral pediátrico envolve a utilização de uma tecnologia digital de última geração chamada NanoString, que consegue detectar e quantificar centenas de moléculas de RNA simultaneamente e, dessa forma, identificar exatamente qual o subtipo do meduloblastoma.

De acordo com Rui Reis, essa abordagem modifica a rotina diagnóstica deste tipo de tumor, sem custo adicional e sem a utilização de material biológico adicional, obtido por meio das biópsias, proporcionando também um resultado rápido e preciso. “Nesse trabalho houve grande inovação. Com o estudo genético, classificamos se há determinadas características muito importantes para a evolução do tumor. Com isso, obtemos vantagens, ganhamos tempo e dinheiro. Muitas vezes, os testes não são realizados porque a quantidade de tumor que se retira não é suficiente, e essa técnica propicia um “dois em um”, economizando material”, explica.

Novo tratamento – a segunda pesquisa foi realizada pela médica Bruna Mançano, sob orientação do médico Rui Reis, a partir dos equipamentos e da tecnologia obtidos com os recursos destinados pelo MPT.

O estudo, publicado na Pathobioloby, importante revista internacional da área oncológica, relatou a aplicação de uma inovadora terapia-alvo em uma criança diagnosticada com um tumor cerebral agressivo (gliossarcoma infantil).

O caso se destaca por se tratar de um paciente do Sistema Único de Saúde que fez uso do diagnóstico molecular. Uma medicação específica, não disponibilizada pelo SUS, foi identificada com alto nível de eficácia para mudar a sobrevida e a qualidade de vida no paciente. O Hospital de Amor está disponibilizando o remédio gratuitamente para o paciente durante o tratamento.

“O gliossarcoma em crianças não tem um tratamento eficaz. O que fizemos foi alargar a pesquisa do perfil genético, o que nos levou a encontrar uma alteração em um gene. Foi a primeira vez que identificamos o dano. Hoje existe uma droga desenhada para este tipo de dano, que foi comprada pelo hospital para uso no tratamento. A criança está evoluindo muito bem, sem efeitos colaterais, e com qualidade de vida muito melhor. A reação está sendo a melhor possível e a doença está controlada”, observa Reis.

Pesquisa - O Hospital de Amor foi beneficiário de uma verba de R$ 70 milhões, destinada a partir de uma indenização por danos morais coletivos do notório caso Shell-Basf.

O projeto foi divido em 4 vertentes: pesquisa, prevenção, tratamento e educação em oncologia. Para o cumprimento das metas foi construído o Centro de Pesquisa Molecular em Prevenção do Câncer, um laboratório de pesquisas de câncer completo e altamente especializado na cidade de Barretos, um hospital de prevenção do câncer em Campinas e 4 carretas de prevenção e educação. O montante também foi utilizado para sequenciamento genético, que contou com aproximadamente 350 mil exames de rastreamento, o que tem por finalidade, a partir da análise de biomarcadores tumorais, possibilitar o diagnóstico precoce do câncer e, assim, aumentar a chance de cura dos pacientes.

A equipe de médicos oncologistas e técnicos do Hospital de Amor conduz, atualmente, as seguintes linhas de pesquisa: fatores ambientais e ocupacionais do câncer; prevenção e detecção precoce do câncer; estudos oncológicos pré-clínicos; biologia e terapia do câncer; genômica do câncer; papilomavírus humano e câncer; biologia dos tumores pediátricos; e câncer hereditário.

Para o procurador Ronaldo Lira, um dos integrantes da Comissão que fez a destinação ao Hospital de Amor, os resultados apresentados são uma evidência do sucesso das destinações de recursos de acordos e ações trabalhistas efetuadas pelo MPT. “O Centro de Pesquisa tem capacidade tecnológica e uma equipe de pesquisadores capaz de trazer muitas outras inovações em tratamentos contra o câncer. Isso é motivo de orgulho para o MPT e fortalece a convicção de que as destinações de recursos feitas diretamente, de forma planejada, são exitosas e representam um grande benefício social”, afirma.

Para Rui Reis, a participação do MPT foi algo “transformador” para a pesquisa oncológica no Brasil. “O MPT foi essa válvula que nos permite acompanhar e estar a par do melhor que se faz no mundo em pesquisa oncológica. Sem o MPT, o processo seria mais longo, pois dependeria de agentes de fomento. A instituição catalisou e permitiu dar uma resposta mais adequada para o problema do câncer, bem como para as soluções que estão disponíveis no Brasil, com o apoio do SUS. A verba destinada pelo MPT também possibilitou a formação de um corpo de técnicos, com médicos mais engajados e com mais conhecimento”, finaliza o médico.

Sobre o Hospital de Amor – Referência internacional no tratamento de câncer adulto e infantil, o Hospital de Amor também se destaca nas atividades de pesquisa, ocupando a segunda colocação no levantamento da Scimago Institutions Rankings (SIR), entre os centros de saúde que atuam na área de pesquisa na América Latina. O SIR é um recurso internacional de avaliação científica para classificar universidades e instituições (públicas ou privadas), que revela algumas das principais dimensões (pesquisa, inovação e impacto social) do desempenho de pesquisa de instituições dedicadas à área em todo o mundo.

A instituição, presente em 14 estados do país, recebe mais de 200 mil pacientes por ano de 2.360 municípios brasileiros, realizando uma média anual de mais de 900.000 atendimentos e quase 3 milhões de procedimentos, todos gratuitos por meio do Sistema Único de Saúde.

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