MPT consegue liminar em ação contra entidades ligadas à cadeia do amianto

Decisão proíbe que sejam pactuadas cláusulas em acordo coletivo que tragam prejuízos à saúde e segurança do trabalhador, por meio da interferência à atuação do Estado 

Campinas – Uma liminar concedida neste domingo (27) pela 6ª Vara do Trabalho de Campinas (SP), nos autos de uma ação civil pública do Ministério Público do Trabalho, proíbe sindicatos de representação de trabalhadores de receberem ajuda financeira de entidades patronais ligadas à indústria do amianto, com o objetivo de evitar conflitos de interesse. Além disso, a decisão impede que sejam pactuadas cláusulas de acordo coletivo entre as duas partes que invadam a atribuição do Estado nas áreas de fiscalização do trabalho, Previdência Social e vigilância sanitária, sob pena de multa de R$ 100 mil por dia.

No início do mês de setembro, o MPT processou 17 entidades patronais e de representação de trabalhadores ligadas a segmentos da economia que se utilizam do amianto/asbesto no processo produtivo. Os procuradores que assinaram a ação alegam que algumas cláusulas do “Acordo Nacional para Extração, Beneficiamento e Utilização Segura e Responsável do Amianto Crisotila”, norma coletiva firmada todos os anos por atores do segmento, trazem prejuízos incalculáveis à saúde, segurança e meio ambiente laboral de milhares de trabalhadores brasileiros.

Dentre as irregularidades constatadas no Acordo estão a criação de comissões de fábrica compostas por trabalhadores destreinados e sem capacidade técnica para substituir os fiscais do trabalho; a composição de comissão de médicos no sentido de esvaziar a perícia médica do INSS; e o desprezo à orientação de embargar ou interditar setores ou máquinas que estejam submetendo trabalhadores a altos níveis de exposição ao amianto.  

A liminar proferida pela juíza Maíra Guimarães Araújo de la Cruz impede que os réus, no âmbito do Acordo Nacional, pactuem cláusulas normativas voltadas à organização e manutenção de comissões de fábrica para executar atividades típicas de inspeção do trabalho e vigilância da higiene industrial e saúde do trabalhador, meio ambiente e segurança do trabalho; que sejam incompatíveis com medidas de urgência fixadas pela Norma Regulamentadora (NR) nº 3 do Ministério do Trabalho e Emprego (embargo e interdição) ou que estabeleçam limites de tolerância maiores do que 0,1 fibra/cm³ de ar; que invadam a esfera de competência da perícia médica da Previdência Social; que prevejam apoio financeiro de entidade de interesse patronal para subvencionar entidade de representação de trabalhadores.

Na decisão, a juíza justifica a concessão de tutela antecipada, em sede liminar, com base nos riscos que os trabalhadores estariam sujeitos pela espera até o julgamento final da ação. “A providência acautelatória ora adotada objetiva, portanto, preservar a saúde do trabalhador, já em risco devido à exposição ao amianto, agente químico sabidamente prejudicial à saúde do ser humano”, conclui a magistrada.

Sobre a ação - São réus na ação civil pública a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Instituto Brasileiro de Crisotila (IBC), o Sindicato da Indústria de Produtos de Cimento do Estado de São Paulo (Sinprocim), o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos de Cimento (Sinaprocim), a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria da Construção e do Mobiliário (Contricom), a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), a Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA), e dez sindicatos representativos dos trabalhadores nas áreas de construção civil, cimento e mobiliário de Capivari (SP), Esteio (RS), Pedro Leopoldo (MG), Criciúma (SC), Nova Iguaçu (RJ), Rio de Janeiro (RJ) e estado de Goiás.

Desde 1995, ano de promulgação da Lei 9.055, conhecida como a “Lei do Amianto”, confederações e sindicatos, representativos da indústria e dos trabalhadores, se reúnem anualmente para atualizar as cláusulas do “Acordo Nacional para Extração, Beneficiamento e Utilização Segura e Responsável do Amianto Crisotila”. Trata-se de uma norma coletiva firmada por entidades de direito privado, com força de lei, que tem por finalidade estabelecer normas voltadas, em tese, para saúde, meio ambiente e segurança do trabalho nas frentes laborais em que há a presença do amianto. O acordo tem por finalidade promover a revisão periódica da legislação nacional, especialmente com base na evolução tecnológica e científica apresentada, conforme diretriz da Convenção nº 162 da Organização Internacional do Trabalho – OIT e Lei nº 9.055/95.

O inquérito do MPT apontou os problemas observados nas cláusulas do acordo, que invadem a esfera de competências do poder público, trazendo prejuízos à coletividade de trabalhadores. No mérito da ação, o MPT pede a efetivação da liminar e a condenação dos réus ao pagamento de uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 50 milhões, de forma solidária. O processo tramita na 6ª Vara do Trabalho de Campinas (SP).

A ação é assinada pelos procuradores Luciano Lima Leivas, Márcia Kamei Lopez Aliaga, Lorena Vasconcelos Porto e Ana Lúcia Ribas Saccani Casarotto.

Amianto - Substância reconhecidamente cancerígena pela comunidade científica nacional e internacional, o amianto é utilizado no Brasil principalmente na fabricação de telhas e caixas d´água. A própria Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou formalmente que não existe limite seguro de exposição ao mineral. Por esse motivo, as instituições trabalhistas, como o MPT, se posicionam contrárias à sua utilização.

Processo nº 0011751-32.2015.5.15.0093

Imprimir