MPT quer o fim do trabalho infantil e do meio ambiente de trabalho precário em olarias de Cabreúva

Audiência pública alertou empresários sobre a proibição de contratar pessoas menores de 18 anos para laborar neste tipo de atividade e também sobre a precarização das relações de trabalho no tocante à saúde e segurança do trabalho

 

 

Campinas - O Ministério Público do Trabalho realizou na noite dessa quinta-feira (22) uma audiência pública com donos de olarias na cidade de Cabreúva, no sentido de alertar sobre a proibição do trabalho de crianças e adolescentes neste tipo de estabelecimento. O objetivo da reunião foi o de erradicar o trabalho infantil na cidade, sendo essa uma preocupação compartilhada não apenas por procuradores do MPT, mas também por agentes do município, como o Conselho Tutelar. Segundo o que já foi investigado pelo órgão, a presença de menores de 18 anos na fabricação de tijolos em Cabreúva é algo comum, especialmente devido ao sistema de economia familiar implementado nos negócios de pequeno porte. A audiência contou com a participação dos procuradores Éverson Rossi e Carolina Hirata Zedes, e do desembargador João Batista Martins César, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.

O encontro, que foi realizado na sede da Câmara dos Vereadores de Cabreúva, também chamou a atenção dos empresários para aspectos trabalhistas voltados à segurança e saúde dos empregados. Uma série de inspeções empreendidas em Cabreúva apontou para a precarização das condições de trabalho nas olarias, com relação às normas de duração do trabalho, regras de remuneração, fornecimento de equipamentos de proteção (individuais e coletivos), proteção de máquinas e equipamentos e condições sanitárias e de conforto no ambiente de trabalho.

Auditório da Câmara recebeu donos de olaria
Auditório da Câmara recebeu donos de olaria

“De início levantamos a existência do trabalho infantil no segmento, mas depois verificamos que o problema era muito maior, e envolvia a precarização da mão de obra. Entendemos por precarização a falta de anotação em carteira de trabalho, de pagamento de 13º salário e férias, de medidas de saúde e segurança, e dos demais direitos comuns a qualquer trabalhador brasileiro”, afirma Éverson Rossi.

O procurador lembrou da importância de priorizar a segurança no ambiente de trabalho, algo que não é observado pelos empregadores da região, citando as normas regulamentadoras que impõem regras relativas à proteção do trabalhador em todos os aspectos da relação laboral.

Para Éverson Rossi a jornada dos trabalhadores  deve ser adequada
Para Éverson Rossi a jornada dos trabalhadores deve ser adequada

Procurador fala sobre problemas observados nas olarias
Procurador fala sobre problemas observados nas olarias

O membro do MPT teceu comentários acerca da jornada de trabalho dos empregados de olarias, que geralmente tem início bem cedo, por volta de 3 horas da manhã. Devido ao horário, pais e mães que trabalham no setor encontram dificuldades para colocar os filhos em creches e escolas do município, sendo este um fator decisivo para a ocorrência do trabalho infantil. “A ideia é inserir as crianças em creches compatibilizando a jornada de trabalho dos empregados de olarias. Não há a necessidade de ingressar no trabalho tão cedo”, disse.

A procuradora Carolina Hirata Zedes explicou de forma didática as atribuições do Ministério Público e o porquê da presença do órgão no município. Ela esclareceu que, apesar do caráter preventivo da audiência pública, o MPT empreenderá uma atuação repressiva no município à medida em que forem encontrados casos de descumprimento da lei trabalhista, em especial o trabalho infantil. Por meio de exemplos embasados em condenações judiciais, a procuradora demonstrou a gravidade das sanções que podem ser sofridas por empresários descumpridores da legislação.

“Há casos de grandes condenações pecuniárias, justamente para punir o descumprimento da lei e prevenir novas violações. É bem pacífica a configuração do dano moral coletivo em caso de desrespeito às normas de saúde e segurança do trabalho”, alerta Carolina.

 

O desembargador João Batista Martins César, um combatente do trabalho infantil, proferiu uma palestra totalmente voltada aos riscos do labor de pessoas menores de 18 anos em estabelecimentos como as olarias. O magistrado e ex-procurador do MPT iniciou a exposição falando das sanções internacionais às quais estão sujeitas o nosso país em caso da não observância da lei relativa à proibição do trabalho de crianças e adolescentes.

Segundo decreto federal nº 6.481/08, o trabalho em olarias é considerado uma das piores formas de trabalho infantil, devido aos riscos decorrentes da atividade à saúde física e mental de crianças e adolescentes.

Sempre calçado em números e estatísticas, o desembargador deu o panorama do trabalho infantil em todo o Brasil, destacando a situação do estado de São Paulo. “Nós, paulistas, falamos com orgulho que São Paulo é a locomotiva da nação. E realmente o é. Mas é também o estado que apresenta o maior número de acidentes notificados de trabalhadores com idade inferior a 18 anos. Isso é uma vergonha”, observa.

João Batista desacreditou o mito de que o trabalho precoce tira crianças e adolescentes da rua, afastando-os da criminalidade. Segundo estudos apresentados por ele, cerca de 80% dos presidiários foram vítimas do trabalho infantil, o que prova que trabalhar cedo traz prejuízos incalculáveis, inclusive para a saúde, formação intelectual e social da criança.

João Batista Martins César fala sobre os perigos do trabalho infantil
João Batista Martins César fala sobre os perigos do trabalho infantil

Desembargador desmistifica afirmação de que trabalho infantil combate criminalidade
Desembargador desmistifica afirmação de que trabalho infantil combate criminalidade

Por fim, o magistrado exaltou a educação, a importância do brincar, e citou casos de pessoas que se arrependeram de não ter estudado mais, brincado mais e trabalhado menos. “O trabalho infantil gera a perpetuação da miséria. Aqueles que trabalham precocemente serão menos qualificados, pois estudarão menos, e terão as piores colocações no mercado, mantendo um ciclo de pobreza”, finaliza.

A partir da audiência pública, o MPT iniciará um trabalho de repressão às irregularidades trabalhistas nas olarias de Cabreúva. 

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